Depois, já acordada, viu os mesmos dois que se deitavam lado a lado a dançar devagarinho ao som do Filme Triste. O chão de madeira escura e brilhante que imaginou debaixo dos seus pés foi o palco de um lindo filme triste. Era uma tristeza bonita que só era triste porque a cabeça dela descansava inerte no ombro dele e dos olhos lhe saltavam lágrimas tristes que só eram tristes porque ela as não aguentava no peito. O chão de madeira escura e brilhante reflectia as bolas pequeninas, verdes e azuis do vestido que ela trazia e que comprou na Retrosaria Proença por 5 euros. Em bicos dos pés, a tremer em cima dos saltos dos sapatos novos, lá acompanhava os passos dele que conhecia, melhor que ela, o ritmo da música que afinal era o ritmo das lágrimas dela que afinal era o ritmo do arrastar sincronizado dos dois pares de pés. Sem nunca levantar a cabeça do ombro quente dele, deram voltas e voltas vagarosas numa sala também ela vagarosa de tão vazia. Dançavam tão juntos um ao outro que só havia espaço para o silêncio. Guardaram pois o que tinham para dizer e dançaram devagarinho até as luzes se apagarem. A música continuou. O filme triste a repetir-se e a repercutir-se contra as paredes da sala vazia.
(para ler ao som de Filme Triste do Trio Esperança)
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